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Quem não se comunica…


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Vivemos em um mundo à beira de um grande conflito, e costumamos ouvir que o que está faltando é diálogo. Se olharmos para o mundo comum ao nosso redor, também encontraremos uma série de pequenos conflitos, pessoais e profissionais, sobre os quais podemos fazer o mesmo comentário: está faltando diálogo.

Tudo ocorre a partir do diálogo. No livro “A Segunda Criação”, de Ian Wilmut (Editora Objetiva), o responsável pela clonagem da falecida ovelha Dolly, há uma reflexão perturbadora a respeito desse assunto. Diz ele: “os genes não operam isoladamente. Eles estão em diálogo constante com o resto da célula, que por sua vez, responde a sinais de outras células do corpo, que por sua vez estão em contato com o ambiente externo. Esse diálogo controla o desenvolvimento do organismo (…). O diálogo entre os genes e o ambiente que os circunda continua depois que o animal nasce e durante toda a sua vida, e, se ele não se processa corretamente, os genes saem fora de controle, as células crescem desordenadamente e o resultado é o câncer”.

Trata-se de uma reflexão a respeito de um fenômeno biológico, sobre o comportamento das células, mas nos remete a uma segunda reflexão, esta sobre o comportamento das pessoas. Seríamos nós, como sugere o texto, produtos de um permanente diálogo entre nosso interior e o mundo em que vivemos? Seria o ser humano um animal parcial, considerando que seu comportamento só é definido por si mesmo pela metade, estando a outra parte entregue à variação aleatória de um mundo em permanente transformação?

Ao que tudo indica, sim! Nosso bem estar, nossa produção, nossa felicidade, não dependem apenas de nosso interior, mas também da qualidade do diálogo. Dependem do sentido dessa palavra que vem do grego, através do latim, e chega ao português querendo significar a comunicação entre duas pessoas objetivando troca de informações e construção conjunta do entendimento. Diálogo pressupõe dois. Ou seja, duas fontes emissoras e receptoras interagindo.

Nesse sentido, sou eu e o mundo, em permanente troca de informações buscando o consenso, que, em última análise, é condição para a felicidade. Entender o mundo e me fazer entender por ele é o grande desafio. Ninguém deve ganhar esse diálogo, pois ele não é um embate, é um apelo de paz. Mas o mundo ataca, dizendo que ele é plural, portanto complexo e mais forte. Esquece-se que eu também sou plural, também sou um mundo, um mundo interior. Então é um diálogo entre mundos. Não há desigualdade.

O que deve haver é disposição e ao mesmo tempo exercício permanente do diálogo. Entretanto, entre dialogantes costuma-se cometer como erro, o descompasso entre o falar e o ouvir. O erro de impor, que é tão erro quanto o erro de aceitar a imposição. O diálogo existe para que não haja imposição, e sim entendimento, compreensão, consenso ao final.

“O mundo não me entende” ou “não entendo mais esse mundo louco”, são expressões comuns, e todos nós já as pronunciamos. Há um período em nossas vidas que até as pronunciamos demais, para depois ir diminuindo esse desentendimento. Quando diminui? Ora, quando amadurecemos, e, portanto melhoramos nossa capacidade de dialogar. Com a maturidade, nos fazemos entender melhor, e entendemos com mais qualidade as informações que recebemos. Esclareça-se aqui, que maturidade tem menos a ver com a idade, e mais com a experiência, com a educação.

Viverei melhor, quanto melhor dialogar com a pluralidade do mundo. A profissão, o trabalho, a família, o amor, o sexo, o dinheiro, a vida, a morte. Da qualidade do diálogo vem a qualidade da vida. O diálogo bem sucedido acalma, amansa, amaina, aveluda, alegra. Do diálogo vem a lógica e também vem a emoção. Por outro lado, como já ouvimos do geneticista (e genética somos): “quando o diálogo não se processa corretamente o resultado é o câncer”.

O filósofo Platão viveu na Grécia entre 427 e 347 a.C. Seus pensamentos nos influenciam até hoje e ele só escreveu em forma diálogos. No final do primeiro, Apologia a Sócrates, atribui-se a este, já condenado à morte, a última manifestação: “já é hora de irmos: eu para a morte, e vós para viverdes. Mas, quem vai para melhor sorte, isso é segredo, exceto para o criador (… com quem terei um diálogo eterno)”.

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